sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Caos frente ao espelho

É muito simples achar feio o que ultrapassa a moldura de um espelho. Somos muito rápidos em apontar a insensatez alheia, no entanto, vagarosos em enxergar a própria loucura. A vaidade é um abismo que cavamos aos poucos. Ela chega disfarçada, apresentando-se com outros nomes mais sutis. Amor próprio, auto satisfação e, por vezes, ousadamente, se intitula de vontade de Deus. Dizemos que estamos fazendo para agradar a Deus, repetimos para nossa própria consciência que está tudo bem, que não é nada demais, quando a verdade é que nossa mente está um verdadeiro caos, bagunçada demais para termos coragem de dar uma boa olhada.

Quando olhamos ao nosso redor nos dando conta de quão distorcido está o mundo, seria reconfortante imaginar que em nosso interior particular as coisas estão em paz. Ficamos de cabeça baixa, como uma criança se entretendo com a sombra dos pés, se agarrando a quaisquer válvulas de escape que possam fazer a ignorância da nossa própria depravação mais duradoura. No entanto, toda tentativa de fuga é inútil e, eventualmente, teremos que encarar que talvez o caos refletido no espelho a nossa frente, seja muito mais preocupante que o caos ao redor da moldura.

O homem não é um bom juiz do próprio caráter. A vaidade, um dos pedaços mais nojentos da nossa carne, não permite um julgamento sincero. Nossa natureza está embebida de arrogância, independência e todos os tipos de concupiscência. Todos mesmo. Não se engane achando que é incapaz de cometer determinada atrocidade, acredite, você é. Se você subestimar a sua carne, quando menos perceber, já terá cometido. É impossível erguer a cabeça para encarar o espelho a frente por si só, estamos inertes, como mortos, incapazes de enxergar. Nos consideramos decentes, humildes e bons o suficiente, contudo, nossas melhores vestes de justiça são como trapos de imundícia comparadas a santidade de Deus. Apenas Deus pode sondar o nosso coração com precisão, apenas Ele pode transformar aquilo que decidiu que precisa de mudança depois de nos examinar. É Ele quem levanta o nosso rosto diante do espelho. E, não há dúvida, que todo aquele que encarar o que está a frente do espelho, seu interior particular, cairá em arrependimento genuíno diante de tanta depravação, mas ainda bem que Deus, em sua maravilhosa graça, nos salva. A maior evidência da salvação é uma vida em arrependimento genuíno, isto é, não basta que eu apenas me arrependa por hora, mas é necessário continuar me arrependendo todos os dias.

Quando Deus levanta o nosso rosto diante do espelho da nossa própria realidade, nascemos de novo. Simplesmente, deixamos de ser quem fomos. Já não somos conterrâneos do caos, mas vivemos como estrangeiros nele. Passamos por um processo de regeneração, de glória em glória, cada vez mais profundos na presença de Deus. É do Senhor que vem a real transformação. Quem não nasceu de novo em Deus, viverá confortavelmente no caos e gostará disso, continuará ignorando o que está diante do espelho, se preocupando mais em identificar a feitura daquilo que está ao redor da moldura do espelho, do que com o próprio espelho. Pura tolice, pois só é possível se importar verdadeiramente com o caos além da moldura, quando se resolve primeiro o caos de dentro de si, tomando coragem para encarar o espelho, clamando para que Deus traga luz aos lugares mais obscuros.